Newsletter Instante Perecível
Olá pessoa querida, espero que essa news te encontre bem, dentro do possível.
Até quando houver dor, descaso, abandono, morte, genocídio.
Trago para ti essa poesia que é rosto para a dor:
Epigrama n. 4 - Cecília Meireles
O choro vem perto dos olhos
para que a dor transborde e caia.
O choro vem quase chorando
como a onda que toca na praia.
Descem dos céus ordens augustas
e o mar chama a onda para o centro.
O choro foge sem vestígios,
mas levando náufragos dentro.
Vem comigo?
Sessão com título Clariceano para compartilhar com você um texto autoral.
Hoje eu aprendi com Itamar Vieira Junior* que ventura significa o frescor que sobe da terra ao se aproximarem as primeiras nuvens de chuva. Uma anunciação de que o tempo de estiagem está acabando. A chuva vai cair e tocar a terra seca, sedenta. Ventura também é sorte, destino. Hoje eu precisava de uma boa ventura. Sentir o cheiro da mudança que se aproxima. Eu queria mesmo uma boa venturança, mistura de ventura e esperança. Braço que surge, estendido, no meio da escuridão. Sorriso que surge em meio ao desalento. Minha terra anda seca. Minha alma anseia pelo rio cheio de fluxo de vida. Ventura que avisa: a terra ainda é fértil. Espera, a chuva já vem. Sinto o cheiro da terra ao receber as primeiras gotas. Como se exalasse o cheiro de boas notícias, da sede que pode finalmente ser morta. Ou só imagino sentir o cheiro da chuva? Tem dias que a memória é ventura
*No livro Torto Arado
Quando nada mais podemos
Resta a arte
Quando ficamos isolados
Restam os verdadeiros afetos
Quando não podemos mais medir horas de trabalho
Resta medir horas de vida
Quando não podemos escolher mais nada
Restam ainda muitas escolhas
Quando tudo muda
Resta só o que realmente importa
Quando a morte é lembrada todo dia
Resta viver intensamente
Quando uma parte falta
Resta sermos inteiros e íntegros
Quando as marcas não importam
Resta nos importar com tudo que marca
Quando nada mais pode
Resta a vida encontrar um jeito
Quando não é possível ver
Resta a fé
Quando tudo é pressa
Resta parar
Quando nada mais faz sentido
Resta sentir
Quando tudo é desconexão
Resta criar
Quando não reconhecemos mais o mundo
Resta nós nos conhecermos
Quando somos fracos
Resta nossa força e coragem
Quando não posso ficar, inteira
Resta partir
Quando tudo é incerto
Resta a certeza de que estamos vivos hoje
Quando sofremos no presente
Resta valorizar o passado
Quando o presente é doído
Resta a esperança no futuro
Quando tudo desaba
Só resta o presente
Quando tudo é virtual
Resta a presença
Quando não posso mais amar
Resta não mais me demorar
Quando não tenho mais palavras
Resta a poesia
Quando tudo é silêncio
Resta a música
Quando tudo é sério
Resta sorrir
Quando tudo é ódio
Resta o amor
Quando tudo é escuridão
Resta uma luz no fim do túnel
Quando tudo é duvidoso
Resta acreditar em mim mesma
Quando perco a esperança
Resta uma criança
Quando não posso voar
Resta um passarinho
Quando nada são flores
Restam sementes
Quando não posso ir
Resta sonhar
Quando não sei o que falar
Resta escrever
Quando não sei o que sentir
Resta chorar
Quando não sei para onde ir
Resta dançar
Quando tudo passar
Resta a memória
Quando nada mais nada
Resta um mundo
...
por Bruna Berger Roisenberg
O Zine 8M2021. Nele está o texto da Cris Lisbôa que eu li para o podcast Literapia desta semana.
Poetas hoje - conversa com Heloisa Buarque de Hollanda e leitura de poemas (pelas próprias poetas)
Primeiro eu tive que renascer - episódio do 'bom dia, obvious' com Lorena Portela, autora do livro: "Primeiro eu tive que morrer".
+ Essa frase-abraço que ganhei da Renata Bortoli
Estou recebendo de braços abertos sugestões de afetos! É só me mandar.
1984 - George Orwell
Visionário. Vivemos hoje no mundo das teletelas, big brother, Ministério do amor (ou seria o gabinete do ódio?), Ministério da Verdade (gerador de fake news). Enquanto houver literatura, arte, haverá resistência.
Morreste-me - José Luiz Peixoto
Terminei de ler 'Morreste-me' exatamente à meia noite, entre o dia 06 e 07 de março. Um pranto preso no peito pode desaguar pelos olhos. Cada palavra ia revirando a dor em mim e meus piores medos, com a beleza de quem sabe que a poesia é essa flecha, que acerta onde tem que acertar. Poesia é a chave que destranca o peito, que insiste em querer guardar um mar inteiro de sentir só para si. Agora o mundo tem minhas lágrimas. José Luiz Peixoto tem minha admiração. A dor tem um lugar. O luto tem um altar. Os medos tem um rosto. Não, eu nunca esquecerei. A vida cruel por ser vida. Dói-me a vida que em tantos se nega. Gravada na minha pele interior os olhos e a voz de quem eu mais amo. "Não podem os homens morrerem como morrem os dias?"
Me conta o que você anda lendo de bom ;)
Novo Episódio:
Você já leu uma mulher hoje? - Cris Lisbôa
O podcast Literapia foi criado para compartilhar trechos de escritos que eu amo. Lá tem algumas meditações, poesias, palavras-abraço para todos os gostos. Você também pode me seguir no @literapia.podcast
Que bom te ter aqui comigo!
Sugestões, palavras de amor, críticas e tudo o mais, é só me falar. Vou adorar te escutar.
Se você perdeu as últimas news, pode ler elas aqui!
Te cuida e cuida dos teus amores!
Te envio meu carinho,
Bruna Berger Roisenberg