Qual é o peso de cada perda que carregamos? Podemos carregar o peso da perda por gerações. Uma casa abandonada, uma árvore nascendo pelo telhado quebrado, as paredes cheias de marcas de tiros, e um balanço intacto. A dor de perder é maior do que a marca de vida que quem se foi nos deixa? Perdas suspensas como pedras. Cada fio de vida preso ao nó de uma pedra. Com quantas perdas se faz uma vida? Linhas finas, vários nós, e todas as nossas perdas ali. Suspensas. A paz das perdas flutuando, estáticas. Quando dentro de mim todas as perdas se desprendem dos fios, rolam, e derrubam outras perdas. Algumas há muito esquecidas. Todo tempo vivido é tempo perdido. Não volta. Não se perde nunca. Vive forte a cada respiração. Cada perda é uma pedra moldada pelo rio do tempo. Suspender a dor. Suspender o tempo. As perdas todas presas pelos seus fios de vida. Em um círculo infinito, sem começo nem fim. Aprender a viver com as perdas, apesar das perdas, sustentando pedras. Viver sem temer as perdas, tropeçando nas pedras, caindo, sabendo que vou me levantar. Talvez só me arrastar, no começo. Perder é duro como pedra. E se eu puxasse uma pedra, com toda a força do meu corpo, e deixasse ela bater nas outras pedras, como aquele brinquedo de criança, o bate-bate. É possível brincar com as perdas? Ou eu me assustaria com o barulho, a violência, os estilhaços? Algum dia tudo voltaria ao equilíbrio? Mas equilíbrio nunca é estático. Equilíbrio é estar em movimento. Por isso sonho com a suspensão das perdas, nessa imagem arrebatadora de pedras presas por fios, flutuando. O impossível me encanta.
Notícias do lado de cá:
Essa semana comecei a me sentir mais eu mesma (e não mais uma astronauta perdida em um planeta estranho). Voltei a atender alguns clientes (para quem chegou por aqui faz pouco tempo, sou psicóloga clínica), o que tem me feito muito feliz. Já consigo ir de ônibus pro laboratório onde trabalho sem usar o google maps. A cada semana eu conheço mais pessoas incríveis que fazem a minha experiência aqui cada vez mais preciosa. Fui no meu primeiro evento de gala da vida (vestindo o meu All Star). Andei de Tesla pela primeira vez (e não conseguia abrir a porta do carro de jeito nenhum — não tem maçaneta kkkkrying). Colei minhas artes e fotos na parede. O meu quarto começa a ter a minha cara e o meu cheiro (que segundo a minha mãe é mistura de Acqua Fresca com óleo essencial de lavanda — Boticário me patrocina!!). Já adotei uma árvore no parque aqui perto de casa, e estou lendo Clarice Lispector. Durante a semana trabalho muito na minha pesquisa e oscilo entre: “Eu não sei de nada”, “Eu sou uma farsa”, “Finalmente estou entendendo alguma coisa”, “Eu amo fazer isso”, e “Socorroooo Deus”. Eu me cobro demais, e isso é muito bom e muito ruim, ao mesmo tempo. Saio para caminhar quase todos os dias, e a melhor playlist para escutar é essa. Tenho aprendido a viver mais o presente, apesar de muitas vezes sentir angústia por querer planejar o futuro e só ver um enorme passado na minha frente. Aprendo a sentar novamente com a solidão. Tenho medo de me acostumar demais a estar sozinha. Ainda choro de saudades, mas não todos os dias. Cada semana parece um ano. As roupas no varal secam absurdamente rápido. Caminhar nas ruas do centro à meia-noite e não sentir nenhum medo é um sonho. Conheci um treco chamado Blu Tack e estou completamente apaixonada. Já prevejo lotar a mala disso para revender no Brasil (junto com TimTams e Vegemites) para pagar a passagem (uhauha). Comi o triste e delicioso barbecue australiano (uma linguiça doce num pão de forma). Tudo é passageiro, até mesmo a confusão, o desespero e o não saber. Tenho me divertido muito (obrigada, pai)! Deixei minha mãe orgulhosa com meu primeiro feijão feito aqui (mas ainda está muito muito distante de chegar aos pés da perfeição do feijão dela). Me viro como posso, como dá, e isso significa fazer o melhor feijão possível com um feijão de lata. A galeria de arte de New South Wales é uma das coisas mais lindas que eu já vi. Prevejo passar muitos dias passeando naqueles corredores. O tempo de tudo chega quando tiver que chegar, inclusive o tempo da escrita.
O livro de poesia do momento:
Que alegria te ter por aqui!
Bruna do céu, cliquei no poema e descobri que a Literapia é sua. Não sabia! Que loucura, que surpresa linda. Parabéns por mais esse filho colocado no mundo 🤍 fui laaaaa no início dos seus posts e conheci seu poema autoral „tudo o que nos resta“. Obrigada por partilhar isso com o mundo ✨
E essa foto das pedras flutuantes rende altas filosofias e brainstormings 😁
Que texto lindo, Bruna! E é incrível como um feijão de lata pode ser a comida mais deliciosa do mundo né? Esses dias fiz um malabarismo enorme pra conseguir fazer uma farofa! Hahaha comi feliz!