“A casa segue a vocação da asa. E eu, para ser feliz, esqueço-me que sou raiz.” Mia Couto
Às vezes me esqueço que sou raiz. Ou, pelo menos, tento esquecer. Para voar meus voos tão sonhados, para ser asa, para morar nesse voo, para ser inteira céu. Mas eu sou raiz. Preciso de um chão.
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Te escrevo agora assistindo Viva Salvador (Globoplay), com Gil, Caetano, Ivete e Luedji. Minhas raízes cantam, e eu não consigo escutar outra coisa que não as nossas vozes, nossa MPB. Chico me acompanhou a semana toda: “Não se afobe, não. Que nada é para já.” Mas, como canta Belchior, tenho um coração selvagem, tenho pressa de viver e quero o que a alma deseja. Alguns abraços se tornam urgentes, mas vão ter que esperar. Sonhei com os meus cachorros no Brasil, encontrei um boxer igualzinho ao meu Tantan, recebi um postal lindíssimo do meu irmão que está na Itália. Como eu previ naquela poesia que escrevi há algum tempo atrás, estou aprendendo a morar na saudade. Estou aprendendo a deixar as raízes voarem.
aprender a morar na saudade como quem mora em um abraço apertado mas sem sufocar saber que dois corações se encontram e batem no mesmo ritmo mesmo a um oceano de distância
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Hoje flanei pela cidade. Me deixo ser parte. Parte da multidão, parte da cidade (apesar da saudade que me parte, essa saudade que é parte de mim, a saudade de partir). Vou deixando minhas raízes por essas ruas que já amo. Nada me inspira mais do que descobrir encantamentos a cada esquina. Uma feirinha, uma livraria, um livro amado ali, me esperando. Vou andando pelas ruas aprendendo a ser caminho. Vou aprendendo a “andar caminho errado pela simples alegria de ser” (Belchior, te amo!). Me perco para me encontrar. Me vejo ali, refletida nos vidros de um prédio, aqui e agora. Me reconheço outra, no meio do caminho, no entre, aprendendo a ser casa.
Notícias do lado de cá:
A saudade apertou forte essa semana. E eu já perdi toda a vergonha de chorar na rua. Na segunda-feira eu fiz a minha primeira apresentação do PhD (o que foi muito legal!). Meu projeto de pesquisa mudou novamente (e eu acho que para melhor). Leio, leio, leio. Cada vez mais me vejo na imagem que a Aline Valek escreveu: sou uma ilha que vislumbra um oceano desconhecido. Me empolgo, quero descobrir esse oceano. Me assusto com a imensidão do que não sei. Estou aprendendo que na ciência as perguntas importam mais do que as respostas (bem como na vida, não é mesmo?). Ás vezes tudo o que tenho são hipóteses e a curiosidade que me move. Nada está resolvido, tudo pode mudar (e muda mesmo, o tempo todo). E isso me fascina e me apavora. Pesquisar é abraçar as faltas, os desconhecidos, para tentar conhecê-los. Uma tentativa eterna, nada está fechado (ainda bem!!!). Cada dia me vejo mais parte: parte da cidade, do meu bairro, da universidade, do meu grupo de pesquisa, das relações que vou construindo. Já aprendi a dar tchau pro motorista de ônibus (como todos fazem por aqui). Passei a semana comendo hot cross bun (seria o paraíso?). Já te contei dos meus vícios? Ted Lasso, ginger ale, Vegemite e Tim Tam. Já não tiro mais cochilos depois do almoço, mas ainda leio bastante no meu tempo livre (menos do que eu gostaria, confesso). Estou fazendo as pazes com a lavadora de louça (que no início eu detestava, fazia questão de lavar tudo na mão). Virei minha mãe, não posso ter um dia livre que já estou lavando a roupa. Já perdi esse ranço também. E, o mais importante: agora eu tenho um roupão!!!! Minha peça de roupa favorita da vida. Se eu pudesse andava só de roupão. Ele é rosa Barbie, o que eu amei. Semana que vem venho aqui te contar mais sobre o que tem acontecido por aqui. Um abraço forte, feliz Páscoa, e um pedido: abraça forte quem tu ama!
Tomorrow, and tomorrow, and tomorrow
Eu amei esse livro. No início foi uma leitura mais lenta, o tema dos video games não me prendia muito. Mas ao longo do livro fui me conectando com os personagens e suas histórias de amor e perda. Daí não conseguia largar o livro. Vou deixar essas duas maravilhosas que escreveram sobre o livro:
Que alegria te ter por aqui!
que gostoso te ler <3
e obrigada pela menção ;)
Já falei que é sempre muito agradável te ler, né Bruna. Gosto do tanto de delicadeza que vc transpõe p/ as palavras. E esse encantamento que procurou em cada esquina, termina se revelando em cada texto. Em tempo: vc falou em Vegemite!!!! E isso me remeteu a "Down Under " do Men at Work! Hino australiano que, entre outros ícones daí, fala do aclamado vegemite sandwich ! Kkk Por que me lembrei disso? Não faço a minima ideia! Nem nunca experimentei a maldita pasta kkkk Dá uma ouvida: https://youtu.be/XfR9iY5y94s
Feliz Páscoa!